sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Acontece

Acontece.

Foi o final da conversa.

Como no final de um livro sem graça, levantei de minha cadeira e peguei minha caneca. Era hora de tomar um chá.
Precisava entender o rumo da vida. Da minha vida. Obviamente da minha vida, de quem mais seria?
O chá de tangerina tinha um fio de leite para me lembrar de algo que não sei explicar. Lembrava um calor diferente, um lugar seguro, um aconchego.
Eu olhava pra tela do meu computador e procurava motivos. Bebericava meu chá pra aquietar a multidão gritante em minha mente.

O vento era forte e minha janela batia. Meu chá havia esfriado devido minha fixação no ecrã de meu monitor. Tendo em mente durante 15 minutos o fato da palavra ecrã ser extremamente engraçada.

O chá gelado com leite estava intragável.

Eu ainda não entendia e bebericava aquele chá terrível. Que droga de chá. Revoltante.

Queria ficar triste e não conseguia.
Aquele trailer do Star Wars valeu o mês todo.



quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Devaneios

Eu li muitas coisas aterrorizantes nesses últimos dias. Eu fiz coisas horríveis, senti a pior ressaca moral da vida e morri pouco a pouco até entender que era necessário tudo aquilo. Cada gole, cada lágrima, cada sorriso sincero.
Eu fiquei bem perto de um grande erro ou até mesmo, se a positividade me permitir, um grande acerto.
Mas isso não importa, esse pano de fundo serve para afastar aqueles que não tem pretensão de ler até o final.
O que importa é o diálogo fictício entre eu e minha mente que me perturba.

- Você que foi embora, rancoroso e mimado.
- Eu que senti que estava louco, aquilo não era certo e você sabia.
- O que é certo? Quais são suas certezas? Certeza que eu tenho é que a Terra irá rodar por mais milhares de anos, que as guerras não terão fim. Certo é o que você não faz.
- O que eu fiz foi certo. Eu estou certo, sempre.
- Mas eu sou você. E você está errado.

Eu estou errado. Sim, não tem sentido esse diálogo.

Estava tentando afastar o tédio e afastei você. Quando tentei te trazer de volta, você me confundia mais do que eu mesmo.
Quando eu tentei pular, você me impediu e ao mesmo tempo olhou pros dois lados antes de atravessar e ficou.

Não. Não me deixe sozinho. Aqui é tão barulhento, essa cabeça a milhão.

Não. Não posso. Você é só sua.

Eu não sei do que será.
Mas tenho medo disso virar um ultraje.
E me odiar por um dia pensar em tudo isso.

Certeza só que nada será igual amanhã.

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Sonhos de pó

Carros pegando fogo, mulheres gritando, tiros e pó.

Dormi vendo Narcos. Sonhei com guerrilhas, farinha de nariz e formas de se lavar dinheiro sujo. Porém no meu sonho, o dinheiro estava sujo mesmo. Lama, sangue e petróleo. Coincidentemente as três coisas que regem nossas vidas modernas.
Acordei pedindo água. E eno. Maldito seja rodízio de pizza e minha vontade avassaladora de vencer a pizzaria. Saio de lá me sentindo um vencedor. Acordo amaldiçoando meu eu do passado e preferindo ter sido um mero espectador.
Eno, bocejo e banheiro. São 7:00. Muito cedo e minha manhã de feriado não parece um feriado. Parece uma segunda qualquer. Parece que segundas vencem feriados.
Volto pro meu quarto. Lá tenho aqueles que velam meu sono. Meus quadros e só meus. Cuidam de mim quando fecho os olhos e os terrores da noite surgem. Sou uma criança com medo de escuro. Na falta de um ursinho, tenho um Don Corleone olhando cada passo de quem se movimenta pelo meu quarto.
Me arrumo naquelas cobertas. Fecho meus olhos e me reviro. Milhões de pensamentos de uma vez só. Queria uma ilha, um amor, um exército, ser viciado, vencer o câncer, dormir por meses consecutivos, não voltar pra casa por meses consecutivos, te uma religião, comer pastel, saber o nome daquele ator que fez aquele filme em que tudo explode e ele fica vivo no final, fazer uma torta de amora. Onde eu acho amora? Aliás, setembro é época de amoras?
São tantos quereres que me envergonho. Sou tudo aquilo que Gil Vicente condenou. Que Bukowski desprezou. Que Leminski conseguiu transformar em arte.

Pilhas de dinheiro queimando, vasos quebrados, piscinas enormes.

Meu despertador toca. 8:00. Esqueci desliga-lo bem no meu feriado.
Banheiro, água. Olho pro eno. Se controle.
Deito novamente.
Droga, sinto uma fome gigantesca e meus olhos pesam.
Escolho dormir. Ainda mais com essa chuva que começa. Bate na minha janela como meteoros prestes a entrarem em nossa atmosfera e reiniciar nossa existência.

Sotaque torto do Wagner Moura, tortas recheadas com cocaína e Maria Antonieta declara a libertação dos palestinos e todos comemoram com pastel e muito caldo de cana!

Estou sozinho no quarto.
Só penso naquele pastel maroto.
Falo sozinho "É feriado gente"
Deixo a fadiga de lado e levanto.
Pastel de queijo ou de carne? Me pergunto.
Queijo com carne. É meu feriado.

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Broto

Ainda me pergunto por qual motivo que as notícias aparecem pra mim quando já estou com um alto índice de álcool no sangue.  Já está virando rotina.
Fiquei sabendo como todos os outros, da mesma forma. Culpa minha.
Escrevo as pressas enquanto sinto um pingo de sobriedade em minha mente, mas ao mesmo tempo, não me impedindo de ser o cara com um orgulho ridículo e impecável.
Minha irmã será mãe e todo aquele frio que eu sentia sumiu.  Senti uma felicidade instantânea subir. Um(a) pequenino(a), um broto, seu broto estará aqui em alguns meses e seria belo e natural. Seria no mínimo, incrível.
E da única forma que consigo me expressar, por textos sem nexo, tento me redimir por tudo que fiz e que principalmente deixei de fazer.
Não foi justo. Pra nenhum dos lados. Mas de todas as formas que eu sou errado, vejo essa como a chance de mudar.
Mesmo que eu não mude.
Terei que esperar nove meses pra te pagar aquela aposta. Acho que vai valer a pena.
Eu não peço desculpas pra ninguém, acho que já te falei isso.
Menos pra você?

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Ocultas

Por que você se impedia de crescer?
Nunca entendi isso. Você tinha tudo para ser perfeita querida e mesmo assim, decidiu ficar no fundo desse poço sem retorno e sem luz. Mendigando pequenas doses de afeto e altas dose de alcool.
Mas como poderia eu, te julgar? Se nada de diferente fiz. Como poderia eu te ajudar, se a única coisa em que eu pensava em todo esse tempo era em como você deveria ser feliz. Você tinha que ser feliz, era sua obrigação. Sua beleza, inteligência, a alegria que não demonstrava e sua bondade. Você tinha que ser feliz.
Todo o afeto que eu senti, tudo que eu tentei fazer pra te ajudar. Te tirar desse poço em que nos encontramos, não deu certo. Fui incapaz de fazer a única coisa em que achava que era bom. Inútil.
E mesmo assim, te sinto mais próxima, como nas diversas vezes que isso antecedeu grandes desastres na minha vida.
Te amo e te odeio por tudo que você representa na minha vida. Por tudo que teu semblante me faz lembrar, por tudo que eu imagino e pelo certeza dos rumos que isso irá tomar.
Isso é destrutivo pra mim.
Egoísmo.
Por que tem de ser assim?
Você vai dizer que não precisa. Mas eu sei que sim.
Como tudo isso termina mesmo sem começar a vida?
Tudo é um ciclo.
O universo, as eras, as guerras, a fome, a vida e a morte.
Minha vida é um ciclo que me mata e me revive.
Preciso quebrar esse ciclo, impedindo de me matar.
Aos poucos vou crescendo.
Mas você. Você já deveria estar a anos luz de mim.
Acredite.
Eu sempre estou certo.

domingo, 5 de julho de 2015

Her

É difícil descreve-la.
Vamos do básico. É linda. Seu sorriso são como as manhãs que iluminam tudo que o Sol vê. Seus olhos são profundos, me dando a sensação de que existe muito mais do que eles mostram.
Não é fácil assim. Ela não sabe, mas me salvou de mim mesmo diversas vezes. Da destruição que causo de tempos em tempos. Dos tiros pro alto, na boca e no pé.
A forma como ela me afeta é inexplicável. Seu jeito sensível me pegou sem que eu notasse e mesmo que não tenha uma vida como a minha, suas histórias me fascinam, até mais quando são mais simples. Não quero riqueza nos detalhes ou na construção de textos. Quero que ela me mostre a riqueza que transmite pela sua voz, sua alegria de viver. A vida pra ela é simples e positiva. Ela não pensa na sua mortalidade, como eu penso todos os dias. Não é a toa que sinto que descrevo uma Elfa. A beleza, a superioridade sobre mim e sua imortalidade.
Mero humano como eu, não posso deslumbrar sua face. Não sou digno.
E os amores que sente? São intensos, ou deveriam ser. Não consigo imaginar alguém que não entenda, não sinta, não a ame com todas as forças. Não cuide dela como se todos os dias fossem os últimos, como se ela fosse a razão pros astros rotacionarem em torno do sol, das plantas fazerem a fotossíntese. Dos amores existirem. Ela é a fonte de todos os amores.
Mesmo que ela não seja uma Elfa e não viva pra sempre, ela estará sempre eternizada em mim, em meus contos, poemas e em todas as coisas belas desse mundo.
Existem sorrisos que não devem ser esquecidos.
Amores que não podem ser perdidos.
Pessoas especiais não sabendo que são, além de tudo, especiais.

sábado, 30 de maio de 2015

Esta É Pra Você

Eu morri seis vezes em vinte anos. Um bom número? Não acho. Só sei que não quero morrer uma sétima vez. Chega.
Mas como?
Quando se tenta sair de uma dessas mortes horrorosas, sempre vem outra em seguida. É realmente horrivel. Eu tentei, eu juro.
Bom, foda-se.
Chega de ser requintado nas palavras, nos gestos. O que importa é ser um bosta, certo?
Se é pra ser assim, que seja.
Não me importo se é legendado ou dublado, se estiver lendo Harry Potter ou Tampa. Se é cerveja ou Coca-Cola, picanha ou salmão.
Não tenho mais motivos pra me importar, já que, nem na terra do nunca, na terra do impossível, em Nárnia, eu sou ninguém.
Mas só eu consigo ver, todo amor, toda dor e profundidade que carregas em seus olhos. Tudo que deixas escondidos. Pra mim és um livro a ser decifrado. Não falta muito para que eu termine. Tanto, que mais próximo do final, tempo depois do climax, minha energia se foi. Estou prestes a morrer.
De novo.
E de novo.
E novamente.
Estou cansado minha querida. Minha alma é velha, ao mesmo tempo que eu sou todo amor e poesia.
Somente e nada mais.
Não tenho mais nada a oferecer
A não ser
Tudo que eu aprendi nessa vida,
Ou uma vida inteira sem te deixar partir dos meus braços.

Acorde otário.
Limpe essa bagunça. A vida esta uma zona.
Não tem ninguem nos seus braços.
Niguem pra te ver assim. Sozinho.
Diga adeus aos ventos
E me deixe voltar a trabalhar.

Atenciosamente,

Aquele que manda e-mails pra ganhar dinheiro, mas queria estar contigo fugindo do mundo, correndo pra qualquer lugar.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Uma Pequena Dose De Esperança

Sou humano. Minha única verdade. Sei que não tenho direito ou motivos pra chorar. Mas eu choro. Minha existência se confunde nas luzes que já se foram.
Ficaram apenas as sombras.

Sente-se meu algoz, a história será longa.

Dizem que só pode falar de amor quem ama. Bom, desde que me conheço sou apenas amor. Pessoas, animais, coisas, lugares, segundos. Mas ainda posso falar de amor se não sei como é ser amado? Faço essa pergunta a anos. Escrevo a menos tempo, mas foi a forma que eu encontrei pra me esquecer desses pensamentos. Sempre que escrevo me aproximo mais deles. Errado.

Beba mais uma dose.

Errado. Sempre fui errado. Acho que aos olhos da sociedade só faltou eu ser canhoto. Eu ia preferir, sempre gostei de ser diferente. Não gosto de Beatles, nem de futebol. Meu pai nunca se conformou. Reclamo de lugares cheios e barulhentos. Meus amigos me deixam. Acho a religião e a interação social falsas. As pessoas se afastam. Minha matéria favorita sempre foi história! Meu passado sempre atormentou meu presente e borrou meu futuro. Só me encaro aos olhos de mais uma dose.

Eu sou falso. Sempre fui. Nunca fui quem eu era, nem pra mim mesmo. Ludibriei, enganei e dissimulei. Máscaras atrás de máscaras. Quem sou eu? Eu sou eu, e também eu e novamente eu. Sou três e sou eu apenas. Quantos mais quero ser?  Quantos eu puder para evitar de ser eu mesmo. Não me olho no espelho. Não sóbrio. Tenho medo de encarar essa verdade de mais de duas décadas, essa depressão sólida destrutiva.

O celular toca e eu me ligo que estou no metrô. Sentado. Rumo a algum lugar que seja menos barulhento. Vazio.

Um amigo me diz que será pai. Assustador. Sinto uma felicidade instantânea. Ele está feliz, a mulher dele está feliz.

Eu estava feliz. Sentir a felicidade dos outros é algo estranho, algo bom.

Ele disse pra que eu me cuidasse. Qualquer coisa era só ligar. Eles tem medo de que eu faça alguma loucura. Desligou.

Aquela noticia ecoou em minha mente até que eu chegasse ao meu destino. Me distraiu. Talvez o mundo tivesse esperança, alguma salvação. Ainda era possível ser feliz, ainda era possível ser feliz pela felicidade dos outros.

Estava na rua já.

- Olha a cocada!

Não era uma má idéia.

- A cocada é 5.

Virou uma má idéia. 5? Uma cocada?

- É a melhor cocada de São Paulo!

Ele sabia que era. Ele acreditava naquilo e assim era. Ele realmente sabia.

Minha casa. Meu canto, meu quarto e minha cama.  Uma cocada de 5 pratas, que, não sei se era a melhor de São Paulo, mas valia.

A cocada, a felicidade instantânea e uma esperança fraca. Mas renovada. Todos valiam.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Sóbrio Atrapalhado

Eu não queria estar ali. Não daquele jeito, enfrentando aquela realidade. Não sóbrio.

Todas aquelas pessoas, bebendo, fumando, rindo. O que elas eram?
As vezes sinto como se eu caísse sem perceber no meio de uma situação, lugar ou conversa. Sem saber o que fiz pra estar ali, o que precedeu. Eu sempre me perco nesses caminhos e ali não foi diferente. Ao mesmo tempo que eu queria estar ali eu me sentia vazio, sem motivações. Não havia nada que me prendesse ali.
Eu sou o estranho. Aquele que lá, não habita. Um forasteiro que esta de passagem em uma velha e rica vila no meio da felicidade. Eu sou a tristeza que deve ser afastada.

Mas me engano. Quero ser parte daquilo. Quero construir uma casa naquela vila.

Mas sou o estranho. O doido. O nerd. Sempre carreguei esses fardos. São meus.
Agora a felicidade deles, as risadas, os amores, os olhos dela. Como posso aguentar tudo isso?
Eu mereço o exílio. Sou um apátrida.
Eu estava sóbrio e foi tudo pior. A felicidade deles feriu minha dor. Eu já estava morto, agora só espero que busquem esse corpo vazio.

Sou um sóbrio atrapalhado. Não sei lidar com as questões do dia a dia. Não aprendi a lidar com felicidade.

Me resta então o que?

domingo, 22 de março de 2015

Felicidade

"Mais um domingo.
Novamente,
Somente você.
-O que temos para hoje?
A melancolia eterna,
E quem sabe,
Uma solidão paranoica."

    Sonhei com você e acordei assustado. Já tinha me esquecido a tanto tempo. Foi estranho ao ponto de eu não saber quem eu era e quem você era. Quem éramos.
    Não sei mais o que causa tamanha infelicidade nesse ser, mas sei que a cada segundo, você acaba com ele apenas nos meus pensamentos mais profundos.
    Quem nasceu no escuro não pode ser feliz.
    Esqueça tudo o que eu já te disse e sente-se. A verdade sempre foi tudo para mim, mas, o que era pra você? Apenas frases aleatórias que não tinha um sentido certo?
    Hoje me sinto na incapacidade de sentir qualquer tipo de afeto humano, é tudo tão mentiroso, tão falso. Me sinto robótico e aquela felicidade que vejo ao olhar pra fora da janela do ônibus me enjoa.
    Eu desaprendi a ser humano.
    E a cada gole me sinto mais longe, mais solto. Não posso me lembrar de tudo, mas eu sempre lembro.
   Lembro de uma bola preta, um quintal velho e pernas que não me obedecem corretamente.
    Lembro de um sofá azul, uma tv, minhas pernas e meu desenho favorito.
    Lembro de um ônibus e uma flor em seu cabelo.
    Só não me lembro de como é se sentir feliz.
Alguém,
Por favor,
Sabe como é?

sábado, 14 de março de 2015

Covarde

E foi um baque de realidade.
A porta se fechou e o trem foi embora.
Meu peito doía e minha cabeça estava pesada. Me joguei no chão daquela estação e me escorei em um canto qualquer. Eu não entendia nada. Todo o rumo, todo alto astral, confiança. Tudo. Por água abaixo. Minha cabeça deu um nó. Você deu um nó em minha cabeça. Quem eu era?
Voltou meus medos, meus credos, meus ritos e minhas lágrimas. Eu tinha tudo de volta, menos o que eu mais queria.
Eu te queria mas não podia dizer. Eu não me permitia.
Pare!
Eu gritava do fundo da minh'alma. E eu parei e me calei e me omiti.
Fiquei só, no meu canto querendo dizer as coisas mais belas do mundo apenas para seus ouvidos. Mas as coisas mais belas apenas ficaram ecoando em minha mente e decidiram se transformar nos medos mais aterrorizantes.
Eu não era eu.
Faz anos que eu não sou eu.
Eu não sei mais ser eu.
Foi sufocante. Eu só queria sair correndo, mas ao mesmo tempo só queria estar ali. Contigo.
Vamos trocar nossas lentes, minha linda.
Seus olhos cor de mel hipnotizam meus olhos escuros e sem vida.

Covarde.

sábado, 7 de março de 2015

Eu sou

Os olhos dela eram cor de mel.
-Eram? Não são mais? Morreu?
Ainda são, mas quero me expressar assim.
- Ela faz parte do seu passado então?
Ela faz parte do meu presente, mas acho que fica mais bonito usar o verbo no passado.
- Eu sou a sua completa falta de estética.
Então fique quieto, minha falta de estética não fala.
Seus olhos eram lindos, cor de mel. E eu sentia seu medo de longe.
- E quem não teria medo?
Medo. Ainda não entendi o que você esta fazendo aqui.
- Estou tentando te ajudar a entende-la.
Nós nunca vamos entende-la. Aqueles olhos que hipnotizam, aquele sorriso reconfortante.
- Já parou pra reparar naqueles olhos cansados?
Primeira coisa que vi. Existe uma sabedoria escondida naquela alma que ela ainda não descobriu.
- E esse seu sorriso bobo?
Nosso sorriso bobo? Você sabe. Imagina a cena: Aqueles olhos meio fechados por conta da luz do sol. A luz faz brilhar ainda mais seu rosto. Ela te vê e te da meio sorriso. Meio sorriso é o bastante. E então ela afasta o cabelo do rosto colocando uma parte atrás da orelha, enquanto a outra rebelde, volta para seu lugar original.
- Só isso?
Preciso de mais o que? Quer uma trilha sonora? Fogos de artifícios? Um desfile do ano novo chinês? Ela não precisa de nada disso. Ela por si só basta. Dentro dela parte os maiores questionamentos da humanidade, apenas faltam palavras para se expressar.
- Mas e o medo?
Acho que todos nós sentimos medo.
- Nós ainda sentimos muito medo.
Sim. Doeu tanto, nos matou. Mas foi bom por um lado. Aquele frio na barriga, aquelas conversas de madrugada. Estar sozinho, mas nunca por completo. Da muito medo.
- Eu sou seu medo.
Eu sou seu passado, seu presente e seu futuro. E você era meu medo. No passado fica bem melhor.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Phill

Para E. R.


- Então Phill, me conte, por qual motivo você empurrou seu irmão?

- Essa é a memória mais marcante que você tem de seu pai?
Quem perguntava era uma mulher. Tinha cabelos curtos e brancos. Seus óculos eram pequenos e quase imperceptíveis, eles não podiam roubar a profundidade de seus olhos.
- Basicamente sim.
Phill não queria estar ali. Odiava tudo aquilo. Aqueles olhos que viam além de sua carne, aquela sala iluminada e acolhedora.
A mulher riscava sua caderneta sem tirar os olhos de Phill.
Phill odiava o barulho do lápis sobre a folha. Principalmente quando era ela que escrevia. Já ouvia esse barulho horrível a tanto tempo e ainda não se acostumara, seu ódio apenas aumentava. Era isso. Ódio, muito ódio guardado e direcionado para aquele lápis e aquela caderneta.
- Mas, por quê?
Enquanto perguntava seus olhos continuavam serenos. Os de Phill não.
- Não sei. Talvez por isso ser o máximo de afeto que eu tinha dele. O tempo todo ele tentando me analisar. O tempo todo querendo saber - Uma risada saiu de Phill - Querendo saber não, sempre sabendo o que eu pensava e mesmo assim, perguntava pra me pegar na mentiria. Eu sempre mentia.
- Então você empurrou seu irmão pois queria a atenção do seu pai? Queria se sentir conectado com ele?
A mulher sempre balançava o lápis. Era seu próprio defeito. Seu tic. Seu TOC. Phil se irritava não por sua mania e sim pela única mania perceptível ser tão superior. Até em seus defeitos ela era melhor que ele.
- Não. Como assim? Não me lembro o motivo de eu ter empurrado meu irmão. Deve ter sido alguma brincadeira. Sei lá.
- Phill, você pode se sentar novamente?
Foi quando Phill percebeu que estava de pé, com os braços abertos. Quando tinha levantado? Era sua raiva, seu ódio.
Phil se sentou enquanto aqueles olhos serenos deixava-o nu por cima dos óculos, sem fazer nenhuma pergunta.
- Isso não da certo. Foi um erro eu ter vindo aqui achando que você ajudaria no meu ódio.
O lápis parou de balançar. A mulher se ajeitou na cadeira. Seus olhos estavam mais sérios, mas sem perder a calma.
- Eu preciso de sua ajuda. Quando você começar a me ajudar, eu vou saber como te ajudar. Essa sua raiva...
Phill bateu na mesa. Seus olhos estavam fechados. Não aguentava mais aquele olhos.
- Minha raiva é culpa dele. Ele fez isso comigo. Ele me alimentou com essa raiva, esse ódio por tudo que está fora da ordem. Isso é ele, não eu.
- Phill, isso não é ódio. Isso que você sente é dor, uma dor causada pela tristeza. Ela é tão forte, que se disfarça de raiva, de ódio. Você não é ele Phill. Você é pura dor. Sua dor fez você me procurar, faz você não conseguir se olhar no espelho, fez você empurrar seu irmão. Você não tem ódio, você não tem culpa.
Lágrimas escorriam pelo rosto de Phill. Se sentia pequeno, inútil.
- Eu só quero que pare de doer. Que um dia eu consiga voltar a dormir.
- Vai parar de doer. Você vai voltar a dormir. Talvez demore um pouco. Mas a felicidade sempre vem.
- Sempre? Você já esta começando a falar como ele.
A hora tinha acabado. Phill se levantou e pegou o caminho da rua. Chovia forte mas nenhuma gota d'água o tocava. Não realmente. Não como ele gostaria.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Marte

Eu tentei acreditar em mim dessa vez. Mas o problema não fui eu. Estranho. Quando estamos acostumados a falhar, sempre criamos um botão em nós mesmos de autodestruição. E apertamos todas as vezes em que estamos próximos de mudar o rumo das coisas. Pelo menos era assim comigo.
Mas dessa vez, não deu tempo. Não sei o que aconteceu. Será que você apertou o seu botão antes que eu pudesse ao menos cogitar apertar o meu?
Não posso dizer que daria tudo certo e que nossas vidas mudariam e que moraríamos em Marte pois já seria habitável. Eu queria. Mas creio que apertaria o botão antes e iria para Marte sozinho.
Acho que esse é meu problema. Pensar em todas as possibilidades e me apegar em apenas as piores delas. Me sinto pior e melhor ao mesmo tempo, e não sei explicar o motivo disso.
Ser infeliz é mais fácil. É a única coisa que me vem a cabeça.
E você Ramona? O que te fez odiar o mundo? Sua infelicidade não deveria existir. Você não merece ser infeliz.
Você merece a felicidade de todas as coisas belas.
Merece os suspiros dos que passam e o prazer dos ossos que realçam em sua pele. Merece o culto e o informal, que se misturam sem perceber, e todas as outras baboseiras que dizemos. Melhor não. Tu não merece qualquer baboseira, é muito pouco. As coisas grandiosas combinam mais com você. Mesmo que sejas tão pequena.

Eu desejo tudo para os outros e nada para mim. Mas isso eu já te contei.

O tempo não cura nada. O tempo apenas passa. Eu não queria ser dono do tempo, apenas dono completo de mim. Me dominar para assim não ter que ir para Marte sozinho.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Queijos e Depressão

- Acho que a sociedade está ditando tudo, até o que devemos ou não sentir.
Gestos tímidos e quietos. Olhos esperançosos e mareados. Era o que eu via naquele momento.
- Está certa. Mas tudo que fazemos é controlado. Nós podemos tentar mudar pequenas coisas, quase imperceptíveis, que por conta disso mesmo, não vão fazer muita diferença. Por exemplo, se tu quiser fazer um Tiramisù, mas percebe que no mercado não tem Mascarpone...
- Não tem o que?
- Mascarpone, um tipo de queijo italiano próprio para o tiramisù.
- Então tu está comparando a nossa sociedade e seus hábitos manipuladores com um queijo?
- Não com o queijo em si, mas com a preparação de uma sobremesa que utiliza queijo.
- Não gosto de queijo.
- Tá ok. Bom, acho que isso não vai influenciar. Tanto. Veja, você não tem mascarpone pra fazer seu tiramisù, mas sua vontade é maior, tu necessita dele, como se fosse a única maneira...
- De ser feliz novamente? Que esse tiramisù fizesse o vazio da solidão sumir. Acabasse com sua depressão...
- Isso, mas a sua depressão vai continuar. Tudo porque tu não tem o queijo certo para ser feliz. O mascarpone é o caminho para a felicidade. E o que acontece? Muitos, ao saberem da falta do bendito queijo no mercado, apenas desistem e voltam a viver suas vidas miseráveis e depressivas. Outros continuam procurando pelo resto da vida, pode ser que demore, mas encontre, como também pode ser que nunca encontrem.
- Então simplesmente, pode ser que um dia o queijo da felicidade seja encontrado. Sorte?
- Sim. Mas há uma terceira saída.
- Existe?
- Cream Cheese.
- Mas Cream Cheese é horrível.
- Já entendi, tu não gosta de queijo. O que eu quero dizer é que se não tem um tipo de queijo que tu precisa, use um semelhante. Existem diversos tipos de queijos tão parecidos e tão saborosos quanto o que tu acha que precisa.
- O cream cheese seria uma felicidade genérica?
- Sim. Um vício, ou algo que te da prazer. Bebidas, comidas, cigarros, drogas, remédios.
- Dinheiro.
- Tudo isso não é felicidade, mas todos eles tem alguma coisa que te da uma sensação tão próxima da felicidade, que é praticamente imperceptível. Da mesma forma que quando tu usa cream cheese no tiramisù. Fica praticamente igual.
- Não sei se consigo substituir meu mascarpone por cream cheese.
- Não é fácil aceitar isso mesmo. Todo mundo quer seguir a receita original, mas um dia você cansa de seguir o que a sociedade manda e faz o tiramisù do seu jeito.